Introdução
Muito se falou e muito se escreveu sobre
o conflito que assolou a europa, de 1914 a 1918, cujo 1º Centenário vem sendo
celebrado.
Nunca será demais relembrar um conflito
que envolveu cerca de setenta milhões de soldados e que causou mais de vinte
milhões de mortos, entre civis e militares, provocando a queda de quatro
impérios: Alemão, Austro-húngaro, Russo e Otomano. Assinalando a entrada do
mundo no século XX. (Gomes, 2010)
Um conflito que todos pensavam ser curto
e fulminante arrastou-se por quatro longos, deixando atrás de si um rasto de
destruição e de morte. É preciso relembrar para que os povos não o esqueçam.
Nesse sentido, a Liga dos Combantentes,
Núcleo de Torres Vedras e Lourinhã, vem organizando alguns eventos e palestras
sobre esta temática.
Este texto procura resumir e dar
continuidade à última conferência que se realizou na Lourinhã, em 27 de Junho
passado e que reviveu o ano de 1915 e a atitude de Portugal perante o conflito.
O
desenrolar do conflito
A Grande Guerra Europeia (1914-1918), vulgarmente
conhecida por I Grande Guerra, por oposição ao conflito que voltou a devastar a
europa no período de 1939-1945, deflagrou no dia 28 de Julho de 1914, quando o
exército Austríaco atacou a Sérvia.
À época, coexistiam na europa um
conjunto de alianças entre as várias potências, que dividiam o continente em dois
grandes blocos: a Tríplice Aliança constituída entre o Império Alemão, o
Império Áustro-Húngaro e o Reino de Itália; e a Entente Cordiale, materializada
numa série de acordos entre a Grã-bretanha e a República Francesa a que, mais
tarde, se juntou o Império Russo.
Eram objectivos imediados destas
alianças prevenir um conflito entre as potências europeias, pela ameaça de
retaliação em caso de agressão a um dos estados aliados.
O império Austro-húngaro atacou a Sérvia
como vingança pelo assassinato do Arquiduqe Francisco Fernando, príncipe herdeiro
ao trono Austro-húngaro a 28 de Junho de 1914, em Sarajevo, por um nacionalista
Sérvio, Gavrilo Princip.
Cometeram-se vários erros de cálculo na
resposta a este incidente pois, sabia-se da antiga e sólida aliança entre a
Sérvia e a Rússia, irmãos eslavos e seguidores da mesma religião - cristãos
ortodoxos. Os Austro-húngaros e os seus aliados Alemães não previram, por um
lado a rapidez de mobilização russa e, por outro lado, a resistência do
exército sérvio.
Daí em diante tudo se desmoronou. A
Rússia veio em socorro dos Servios, a Alemanha cujo plano era, primeiro
derrotar o inimigo a Oeste, a França e, depois, virar-se para Leste, contra a
Rússia, teve que lutar em duas frentes ao mesmo tempo.
Rapidamente a guerra degenerou por toda
a europa. Devido à rigidez das alianças as potências europeias viram-se
envolvidas num conflito que, apenas deixou de fora os países nórdicos e a
Suiça.
Esta Grande Guerra Europeia
transformar-se-ia em guerra mundial com o arrastamento dos territórios
ultramarinos, detidos pelas potências europeias em África e na Ásia. Mais
tarde, em 06 de Abril de 1917, os Estados Unidos da América juntavam-se à Grâ-bretanha
e à França, contribuindo, assim, para a derrota alemã.
Portugal
e a Grande Guerra
Em 1914 o regime político em Portugal, a
República, tinha apenas quatro anos de vigência. Com excepção da França, as
grandes potências europeias eram governadas por regimes Monárquicos.
A instabilidade governativa e o não
reconhecimento do novo regime, pela maioria das nações europeias, contribuíram
para um impasse na decisão de Portugal face ao conflito que alastrava pela
europa.
A velha aliança com a Grã-bretanha, que
vinha de 1373, fazia com que o prato da balança tombasse para o lado dos britânicos.
A maioria dos oficiais das Forças Armadas não queria intervir num conflito na
Europa, devido à má preparação das nossas tropas e à falta de armamento
adequado ao conflito europeu.
As relações entre Portugal e a Alemanha,
à época, eram as normais e não se previa um conflito. No entanto, em Setembro
de 1914, o governo da república portuguesa resolveu enviar dois contigentes
para reforçar a defesa das colónias africanas.
Para Moçambique partiu um contigente
comandado pelo Tenente-coronel Massano d’Amorim e para Angola, partiu outro
contigente, comandado pelo Tenente-coronel Alves Roçadas.
Em 5 de Outubro de 1910, coexistiam em
Portugal dois exércitos distintos: o Exército Colonial, para actuação exclusiva
nas colónias e o Exército Metropolitano, para servir noutros Teatros de Guerra.
A República reorganizou as Forças Armadas, introduzindo o conceito de “exército
miliciano”, factor que muito desagradou aos oficiais do quadro, grande parte
deles com formação feita no tempo da Monarquia.
A reorganização das Forças Armadas de
1911, levada a cabo pela República, no que diz respeito ao Exército Colonial,
não só o manteve como reforçou o seu recrutamento a partir de pessoal indígena.
Evitava-se a ida de militares da Metrópole para África, poupando nos custos e
evitando o descontentamento.
Com o alastrar do conflito na Europa
havia o receio de que a guerra chegasse às colónias. A defesa e manutenção do
“Império Ultramarino” era, naquela época, talvez, o único ponto que unia todas
as forças políticas.
Decidiu-se, então, reforçar o Exército
Colonial, com forças da Metrópole. A Alemanha que tinha sido a última potência
europeia a criar um Império, em África, desenvolvia os seus esforços de
colonização e tinha tropas no Tanganika, hoje Tanzânia (fronteira Norte de
Moçambique) e, no Sudoeste Africano - a Damaralândia -, hoje Namíbia (fronteira
Sul de Angola).
Apesar de não haver uma declaração de
guerra entre Portugal e a Alemanha, os confrontos foram inevitáveis. As
primeiras escaramuças dão-se no Sul de Angola “desastre de Naulila”. Resultado,
a derrota dos portugueses, o que leva à dissolução da coluna de Alves Roçadas e
ao seu embarque para Portugal, no dia 9 de Maio de 1915.
Em Moçambique, as coisas também não
correram melhor. Segundo relatos da época, o desembarque das tropas
Metropolitanas em Lourenço Marques, foi um espectáculo degradante. Os homens
que chegavam para iniciar uma missão mais pareciam um exército derrotado que
regressava de um campo de batalha. (Ferreira, 1996)
O fardamento era inadequado para o clima
africano, a preparação dos homens insuficiente. As doenças, mais do que o
adversário, dizimaram as nossas forças.
A 23 de Janeiro de 1915, dá-se o
primeiro golpe militar, após a implantação da República, que ficou conhecido
por “golpe das espadas”. Em consequência Manuel de Arriaga, presidente da
república, nomeia para primeiro-minitro o General Pimenta de Castro.
Uma das primeiras acções do governo
Pimenta de Castro foi mandar regressar as colunas que tinham ido para África, outra
acção foi parar a mobilização que estava em curso com vista a uma possível
intervenção no Teatro de Guerra Europeu.
Embora não fosse unânime a decisão, as
forças políticas dominantes defendiam a entrada de Portugal no conflito em
França, para que, depois se pudesse sentar à mesa dos vencedores e defender os
seus interesses em África. Sabia-se, que a Grã-bretanha e a Alemanha negociavam
secretamente a cedência dos territórios portugueses à Alemanha, como medida
compensatória. (Leal, 2010-2011)
Por outro lado, era uma forma do regime
republicano conseguir obter o reconhecimento pelas potências europeias.
Em Maio de 1915, o governo de Pimenta de
Castro cai e dá-se a inversão política: volta-se à preparação de uma
intervenção na Europa e são, de novo, enviadas forças de reforço para África.
Em 09 de Março de 1916 a Alemanha
declara guerra a Portugal, depois da apreensão de alguns navios alemães
ancorados em portos nacionais. (Telo, 2014)
Começa a preparação do CEP (Corpo
Expedicionário Português) que embarcou para França a 17 de Janeiro de 1917.
Portugal entrava, assim, no conflito
europeu, com as consequências terríveis que todos viríamos a conhecer e que
mais tarde detalharemos.
_________
Tenente-coronel, José João da Costa
Pereira, Presidente da Direcção do Núcleo da Liga dos Combatentes de Torres
Vedras e Lourinhã
Drª Teresa Maria Farto Faria de Sousa, Centro
de Estudos Históricos da Lourinhã
Bibliografia Consultada
FERREIRA, José Medeiros “O
comportamento político dos militares”, Editorial Estampa, Lisboa 1996;
GOMES, Carlos Matos e Aniceto Afonso “Portugal e a Grande Guerra”, Verso da História (Reimpressão),
Lisboa, 2010;
TELO, António José “Cronologia
Comentada 1915 – Acontecimentos em Portugal”, Academia Militar, Lisboa,
2014;
LEAL, Ernesto Castro “Memórias
da Grande Guerra (1914-1918) na Renascença Portuguesa“ in Revista
Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. I, Nº 3, Juiz de Fora (Brasil),
dez./2010-mar/2011, pp 4-18.
Notas:
(1) os autores escrevem de acordo com
a antiga ortografia.
(2) Este artigo foi, originalmente, publicado no Jornal Alvorada, de Lourinhã, Edião de 02 de Outubro de 2015.
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